29 de dezembro de 2011

Sorria....


Sorria...

Sim, Sorria!!
É certo que pode não resolver tudo o que tem de ser resolvido,
mas torna tudo mais fácil de resolver.





Se não puder ter tudo o que deseja,
que em 2012 tenha tudo o que, verdadeiramente, falta lhe faz.

Um Bom Ano!!


20 de dezembro de 2011

O Natal




E eis que se aproxima
assim,
como quem semeia uma luz possível no coração de cada um
e torna mais visível o caminho por onde vamos.





Ft - "O Semeador de Estrelas" - Kaunas, Lituânia

18 de dezembro de 2011

Invocação a Sophia



"Dancer Adjusting Her Shoe" - Edgar  Degas - 1885


             Há sempre um deus fantástico nas casas
                            Em que eu vivo, e em volta dos meus passos
                            Eu sinto os grandes anjos cujas asas
                            Contêm todo o vento dos espaços.

Sophia de Mello Breyner Andresen, " As casas" in Obra Poética



12 de dezembro de 2011

O tempo dos presépios



É tão breve o tempo dos presépios.
É tão estreita a frincha da janela,  por onde deixamos entrar o céu,  a cintilar em cada um dos quatro cantos de uma solidão espessa e indizível.
De peito quase aberto, acertamos a sintonia dos compassos da humanidade, e os olhos demoram-se mais no interior silencioso das coisas. Há agora, um desejo maior de sermos, a luz que aquece o coração de todos os flocos de neve e a pele que veste o corpo rasgado dos afectos.
Mas é tão efémero o tempo dos presépios, que me excedo já em nostalgia e procuro em mim, o trilho certo para a eternidade dos momentos.  



6 de dezembro de 2011

O inverno dos pássaros



Quando o tempo arrefece e  as horas parecem mais pequenas e mais vazias, detenho-me na alma das aves que se abrigam dentro das próprias asas. Há um desespero estranho colado ao silêncio das suas penas. Há uma solidão velada e fria no canto rasante, sem voo, nem melodia.
É Dezembro.
Em Dezembro, continuo a espantar-me com tudo o que não sei sobre o inverno dos pássaros.





29 de novembro de 2011

Só as vírgulas rasgam desertos



Há dias em que nos sentamos no último degrau e olhamos o lugar vazio onde perdemos a vontade de ser alguma coisa. Abandonamos os braços no sentido do chão e damos ao cansaço o ombro silencioso e estéril de todas as desculpas.
Há noites escuras em que a lua desenha no céu uma vírgula, para nos lembrar do arado que só rasgando o chão consegue lavrar todos os desertos.



24 de novembro de 2011

Celebração da voz humana




Quando é verdadeira, quando nasce da necessidade de dizer, a voz humana não encontra quem a detenha. Se lhe negam a boca, ela fala pelas mãos, ou pelos olhos, ou pelos poros, ou por onde for.  Porque todos, todos, temos algo a dizer aos outros, alguma coisa, alguma palavra que merece ser celebrada ou perdoada.

Eduardo Galeano in " O livro dos Abraços"



21 de novembro de 2011

O eco das palavras dos poetas




Hoje acordei dentro de uma nuvem cheia de palavras.

Cheia de pedaços de poesia que se soltavam da folhagem das árvores de uma floresta de papel que também existia dentro dessa nuvem. Toquei-lhes com o maior cuidado, não fossem elas, as palavras, serem como os sonhos que se esquecem quando os queremos realidade.
Mas não….
Aconchegaram-se como meninas, dentro de mim. Ou eu dentro delas, já não sei...

Quem sabe onde mora o eco das palavras dos poetas?

Juraram que se ouvissem Fantasie-Impromptu de Chopin, renasceriam como borboletas e todos os dias pela manhã, na beira da minha janela, ronronaria um gato e cantariam poemas que, sendo tão puros, simples e límpidos como água, dariam ao meu acordar, a melodia harmoniosa dos rios e das fontes e de todas as paisagens que nascem dentro dos olhos, ou flutuam na alma vindas da espuma do mar. Disseram também, que me trariam um campo de girassóis, um punhado de memórias, uma grinalda de algas ou então,  searas de versos para eu reinventar.
Hoje, quando acordei,  no livro de poesia ao meu lado; No Espanto Das Mãos - O Verbo,  da minha querida amiga Lídia Borges  as palavras aguardavam apenas os primeiros acordes do piano,  para me dizerem da nova sonoridade que semearam dentro de mim. 

À Lídia, os meus parabéns! 
A sua poesia  iniciou  um novo e merecido voo.
Muitos outros lhe desejo.
Por cada um a aplaudo, honrada pelo privilégio de a ler
e de ontem ter estado ao seu lado.


18 de novembro de 2011

Adágios


  

É tão fria a palidez do mundo quando a vida parte.
Quando os olhos se estendem para dentro dos fantasmas.

É tão fria!

Há segundos em que a morte não me estranha
e me pressinto dela,
coisa insignificante e pequena.
Sinto-a a roçar-se-me na pele
a colocar os dedos no sangue das minhas feridas
a rir-se da surpresa dos meus lábios
do medo a nascer-me cascata dentro da boca.
Nesse momento,
num frágil e fugaz momento
deixo de saber se ainda sou,
até que outra alma abandona as mãos dentro das minhas
e estar, passa a ser tudo o que na verdade vale a pena
para que nenhumas mãos
perto de mim
vivam sozinhas.


A morte de Garcia Lorca
óleo sobre tela de Guilherme de Faria - 1959

10 de novembro de 2011

Do fundo mais profundo do chão




Vem do fundo mais profundo do chão
a raiz da urze
que resiste ao corte da sega.
Mesmo despida de flores,
um dia será
o calor de alguém
que recusou morrer no inverno
sem a promessa das papoilas.

É tudo tão simples
dentro de um caule manso.

Por isso me mantenho na direcção dos afectos
pois se até o vento se rende
à persistência das asas.




4 de novembro de 2011

Partículas de mar



Somos apenas partículas de mar.
Gotas de água de um oceano imenso.
Esquecermo-nos disso,  é viver inutilmente nas margens de uma vida sem nunca encontrar uma foz que nos abrace.




31 de outubro de 2011

Nascidos nas mãos




Nas nossas mãos, do lado de dentro das linhas, nasce de nós a poética mais bela.
Por muito tempo que leve a nascer, o tempo é o fermento das melhores searas. E nós, a emergência de sermos no gesto que nos descreve.




27 de outubro de 2011

Outra luz



           Repara poeta;
           No arrasto das folhas ao uivo do vento
     
           As horas não morrem
          
           Aconchegam-se no olhar perdido dos olhos
           À espera que o teu relâmpago
           Ilumine
           A noite de todas as cegueiras



18 de outubro de 2011

Do interior de ti





Falas-nos do interior das pedras
e da rendição do vento quando o homem se ajoelha.

Falas-nos do coração dos astros
e da humanidade guardada dentro das sílabas.
Perfeita é a geometria dos lábios
e o instante é aquele que morre ou nasce
se quisermos.

Falas-nos da lava quente a cobrir-nos os ombros
Da vontade a rasgar-se do fundo da terra
e dos gestos que nos gelam
porque queremos.

Falas-nos das carícias de bruma
a seduzirem ilhas
e da vertigem do mar
que naufraga dentro das ondas.

Falas-nos de solidão e de silêncios
em silêncios.

Escreves-te alma
e bastaria ouvir o que dizes
para finalmente nos sabermos.




13 de outubro de 2011

Dentro do teu afago



                                               Detenho-me nas tuas mãos
                                               e dentro do teu afago,
                                               a minha pele
                                               reconhece-se peregrina
                                               a sacia-se de ti.
                                               Tu que és dela
                                               o tacto aveludado e fresco
                                               de uma manhã
                                               que da noite se renovou
                                               água  de Setembro,
                                               amor entrançado
                                               a manter pulsátil
                                               o meu universo.



7 de outubro de 2011

Nocturnos




Na solidão nocturna das ruas
quando a cidade se cala
crescem em mim as paredes
como redes
e nem as raízes nuas
das árvores que são meu leito
entendem por que me deito
nesse silêncio das ruas.



29 de setembro de 2011

O teu poema



Trago-te o azul das asas e o segredo dos pássaros.
Trago-te a eternidade despida do valor corpóreo das coisas.
E da copa das árvores
um raio de sol
borda a seda  na tua alma
todos os versos de um poema
que em vão
há tanto tempo
tentas escrever na água dos teus olhos.


25 de setembro de 2011

Amo-te!




Amo-te!
Amarei todas as folhas onde os teus olhos repousem.
Ignorarei a chegada do vento onde se aninham  os invernos e, quando te parecer que a natureza te abandonou, encontrarás no meu coração o contorno dos meus lábios.
Saberás então, que há palavras que nunca são inúteis.




16 de setembro de 2011

Promessas do mundo



Na tua mão pequenina
Cabem todas as promessas do mundo
E com elas constróis na areia
O sonho de as ver no mar
A navegar
Nesse mar que as guarda
No fundo
Um fundo tão profundo
Quanto a claridade do teu olhar
Enquanto acreditas
Nas promessas do mundo




13 de setembro de 2011

Ocaso




Ainda não era noite e, no entanto, já não era dia.
Numa brisa leve e triste, esvoaçou à nossa volta o inexplicável.
Perguntaste:
Vai doer?
E todas as palavras se ajoelharam, mudas.
E as minhas mãos, quebraram-se de inúteis.
Desde esse dia, em cada ocaso, passei a amar mais o silêncio.





10 de setembro de 2011

Mantém-te firme!


Entre a angústia e a esperança
é tão fácil nos perdermos....

"Alguém me ouviu " - Boss Ac e Mariza para a ENCONTRAR+SE

Não me resta nada, sinto não ter forças para lutar
É como morrer de sede no meio do mar e afogar
Sinto-me isolado com tanta gente à minha volta
Vocês não ouvem o grito da minha revolta
Choro a rir, isto é mais forte do que pensei
Por dentro sou um mendigo que aparenta ser um rei
Não sei do que fujo, a esperança pouca me resta
É triste ser tão novo e já achar que a vida não presta
As pernas tremem, o tempo passa, sinto cansaço
O vento sopra, ao espelho vejo o fracasso
O dia amanhece, algo me diz para ter cuidado
Vagueio sem destino nem sei se estou acordado
O sorriso escasseia, hoje a tristeza é rainha
Não sei se a alma existe mas sei que alguém feriu a minha
Às vezes penso se algum dia serei feliz
Enquanto oiço uma voz dentro de mim que me diz?

Chorei
Mas não sei se alguém me ouviu
E não sei se quem me viu
Sabe a dor que em mim carrego e a angústia que se esconde
Vou ser forte e vou-me erguer
E ter coragem de querer
Não ceder, nem desistir eu prometo

Busquei
Nas palavras o conforto
Dancei no silêncio morto
E o escuro revelou que em mim a Luz se esconde
Vou ser forte e vou-me erguer
E ter coragem de querer
Não ceder, nem desistir eu prometo

Não há dia que não pergunte a Deus porque nasci
Eu não pedi, alguém me diga o que faço aqui
Se dependesse de mim teria ficado onde estava
Onde não pensava, não existia e não chorava
Prisioneiro de mim próprio, o meu pior inimigo
Às vezes penso que passo tempo demais comigo
Olho para os lados, não vejo ninguém para me ajudar
Um ombro para me apoiar, um sorriso para me animar
Quem sou eu? Para onde vou? De onde vim?
Alguém me diga porque me sinto assim
Sinto que a culpa é minha mas não sei bem porquê
Sinto lágrimas nos meus olhos mas ninguém as vê
Estou farto de mim, farto daquilo que sou, farto daquilo que penso
Mostrem-me a saída deste abismo imenso
Pergunto-me se algum dia serei feliz
Enquanto oiço uma voz dentro de mim que me diz?

Chorei
Mas não sei se alguém me ouviu
E não sei se quem me viu
Sabe a dor que em mim carrego e a angústia que se esconde
Vou ser forte e vou-me erguer
E ter coragem de querer
Não ceder, nem desistir eu prometo

Busquei
Nas palavras o conforto
Dancei no silêncio morto
E o escuro revelou que em mim a Luz se esconde
Vou ser forte e vou-me erguer
E ter coragem de querer
Não ceder, nem desistir eu prometo

Tento não me ir abaixo mas não sou de ferro
Quando penso que tudo vai passar
Parece que mais me enterro
Sinto uma nuvem cinzenta que me acompanha onde estiver
E penso para mim mesmo será que Deus me quer
Será a vida apenas uma corrida prá morte
Cada um com a sua sina, cada um com a sua sorte
Não peço muito, não peço mais do que tenho direito
Olho para trás e analiso tudo o que tenho feito
E mesmo quando errei foi a tentar fazer o bem
Não sei o que é o ódio, não desejo mal a ninguém
Vai surgir um raio de luz no meio da porcaria
Porque até um relógio parado está certo duas vezes por dia
Vou-me aguentando
A esperança é a última a morrer
Neste jogo incerto o resultado não posso prever
E quando penso em desistir por me sentir infeliz
Oiço uma voz dentro de mim que me diz
Mantém-te firme.


4 de setembro de 2011

Desassossego



Sinto-te na boca
pronto a nascer voz dentro de um poema
e no entanto,
decides aninhar-te
entre salivas e silêncios
no leito cálido e manso das minhas veias.
Temes,
que a dor antecipada das sílabas
morra na margem dos meus lábios,
sem saberes
de toda a verdade na génese do mundo
ou que o meu sorriso,
adoce a indignação dos homens
muito antes da revelação nua dos plátanos.
Só não sabes,
que do corte vertical do tempo
colho para ti
um regaço de aguarelas
e todos os aromas de Outono
e nas mãos,
guardo a idade das folhas
onde escreverei
os teus maiores desígnios.



 " Mudança de estação" - Aguarelas de Marah Amaral
 

30 de agosto de 2011

Das palavras que te deixo...




No teu olhar eu descubro
Que o mar
Tem uma cor inventada
Dentro do nosso peito
A mesma
Que a nossa pele vestiu
Quando a desnudámos.





24 de agosto de 2011

Gestos




Pega na folha amarelecida onde somaste os dias e espreme-a, até sentires caírem dentro de ti todos os gestos moribundos de que te esqueceste. É deles que tens de cuidar antes que a vida te morra, e tu com ela, sem te dares conta.



10 de agosto de 2011

Reinventemo-nos




Quando urge reinventar

Todas as formas de vida possíveis
Para além do ruído surdo,
Louco e rouco
Das gargalhadas
De gaivotas e cigarras

E o mar,

É o cenário onde pousam os olhos
De um horizonte árido e solitário

A padecer de nome…
A morrer de fome…

Tomemos a liberdade nos pulsos
E chamemos o tempo escoado
Dos poros das coisas inertes.

Reconfortemo-nos no centro do peito
Lugar onde não existem asas quebradas
Nem voos impossíveis

Plantemos árvores
Que ouvem silêncios

E deixemos que nelas amadureçam os verbos
Enquanto os úteros, semeados de palavras
Germinam gestos
De quem ainda acredita
Na força das searas
Que brotam das terras cansadas
E da verdade dos afectos.





6 de agosto de 2011

Uma história dentro de outra história



No corpo protejo o voo
de um pássaro rubro
 por um fio de luz desenhado
que dia a dia, passo a passo
conquista o que nunca tem
como deveras conquistado.

Sofre e sangra porque é carne
igual em toda a humanidade
e se sabe tão diferente
dentro de toda essa igualdade.

Um dia, será apenas
grão de pó errante
fragmento de memória
principio e fim, linha finita
névoa desfeita sem glória
como a rima dentro desta escrita,
uma história, dentro de outra história.



2 de agosto de 2011

Negra flor




Sem mais, sem qualquer outro aviso, guardaste o lenço impregnado de dias vazios e partiste, apagando os pés na areia à medida que passavas.
Não olhaste para trás, nem te detiveste um só segundo porque, se o fizesses, terias percebido como era negra a flor que eu bordava na orla da minha saia, enquanto as mãos se contorciam descrentes de luz e tempo, ausentes de luar.
É por isso que hoje, eu só amo as rugas do meu rosto, as únicas que, verdadeiramente, nunca me abandonam.


26 de julho de 2011

Vento inquieto





No arrepio das águas
chega o vento,
inquieto e frio
à procura da serenidade das coisas simples
que outrora impregnavam a pele dos barcos
e hoje, já não moram em lugar nenhum.
São apenas,
fracção ínfima do verbo amar
intento perplexo
entre mundos alucinados
que morrem, rente aos mastros
sem nunca terem sabido
como hastear uma bandeira.


23 de julho de 2011

Autenticidade



Woman with Eyes Closed -  Lucien Freud (2002)


Mesmo que no céu voem pássaros de belas plumagens e em terra, as flores se sintam pequenas ante tamanha beleza, a autenticidade é uma vela que nos revela, neste tempo obscuro onde tudo é efémero.
Sagrada é a vida e ela, é que é bela. 
Grande,  
é apenas o que de fértil deixamos germinar dentro dela.





18 de julho de 2011

Mistérios vindos do mar


 Não sabia muito bem como chegara até ali, não se recordava sequer de ter dado ao cérebro as coordenadas do mar, mas era à sua frente que se encontrava, atraída pelo desejo maior de se livrar da angústia.
Não havia nada nem ninguém que a entendesse melhor que o mar. Só ele recebia tudo o que se lhe derramava da alma sem a questionar ou julgar, sem se impressionar com a falta de formalidade do discurso ou com as palavras avulsas, ausentes de rigoroso sentido.
Era apenas ele que a ouvia, num silêncio partilhado, comunhão de água.
Dizia-lhe ele, que tudo o que ia, voltava. Voltava devolvido, diferente, envolto nas algas verdes que saram a erosão do tempo nas rochas. Sopradas do vento norte, trazia-lhe as palavras maternas, sábias, também elas fortalecidas pelas ondas da vida:  “ À tempestade segue-se sempre a bonança, minha filha”.
Sabia-o, mas deixava-se engolir pela incerteza que lhe sugava a força de acreditar nisso.
Estava cansada, era sempre o cansaço que vestia pela manhã e que lhe pesava nos ombros vergando-os no sentido do chão. O esforço com que vencia a inércia de si própria, só à noite o estendia junto a si, em descanso, lado a lado com a ruína dos amores fracassados e o vazio das ausências.

Estava só.
Tinha amigos, poucos. Já não tinha pais e nunca tivera filhos. Era tronco de uma árvore infrutífera, esquecida num pomar abandonado. Só os corvos descobriam nela o abrigo das noites frias, mas rapidamente esvoaçavam. Fugiam, ou ela os espantava, já não sabia. Havia alguma coisa que sempre temera nas aves negras.

Era uma mulher só, para além de sozinha .
Não era por isso estranho que amasse a solidão. Conhecia-a bem e jamais se sentira enganada por ela. Jamais ela lhe prometera outra coisa diferente,  para além do constante e impalpável silêncio de si mesma. Mas às vezes, tantas vezes, sufocava-a. Agigantava-se dentro dela e tomava conta dos espaços exíguos por onde flutuavam os seus sonhos. Desejos humanos e inconfessavelmente femininos. Espalhava-se por todo o lado, escurecendo janelas, encerrando portas, invadindo as paredes até consumir todo o ar respirável. Até ao desmaio quase irrecuperável da esperança.
Naquele dia estava assim, asfixiada e dormente, sedenta de maresia.
Rodou a chave e o motor do carro parou. Pensou sair , sentar-se no paredão, mas a sensação antecipada do contacto da pele com a pedra fria e húmida, fê-la arrepiar-se. Estremeceu, e isso tornou-a mais frágil e desprotegida ainda, numa ampliação desmesurada de auto-comiseração que a envergonhava a si mesma.
Abriu um pouco a janela, ouviu o som do mar a afagar-lhe os ombros, pronto para o amparo da queda. Sem resistência, deixou os braços caírem em cima do volante, neles escondeu o rosto e, completamente indefesa, abandonou-se em si, num pranto convulsivo e incontrolável.
Permaneceu assim não sabe por quanto tempo, até que foi sentindo que o mar levara dela a espuma dos dias mais tristes e lhe restituía, serenamente, a força vinda dos corais em troca de tudo o resto que lhe doía.
Foi nessa altura que ergueu os olhos e viu, preso no pára-brisas, um pequeno papel com algo escrito. Saiu do carro, olhou à volta mas não viu ninguém. Pegou no papel, limpou o rosto molhado à manga do casaco e, com o coração a bater, no ritmo apressado de uma ansiedade surpreendente e estranha, leu:

"Tenha fé.
O tempo resolve tudo.
Felicidades. “

Passaram muitos anos.
Ela não deixou de estar só e de amar a solidão. Continua a procurar o mar e é ele que continua a ouvi-la, como sempre fez. Não, ele nunca lhe disse quem foi que lhe deixou, naquele dia, aquela mensagem. Mas ajudou-a a compreender cada uma das palavras escritas naquele papel, como uma verdade que toda a gente precisa de saber quando, na vida, tudo é menor que desespero.


13 de julho de 2011

A chuva que nos lava



Nem sempre o céu anuncia
a queda da chuva que nos lava;
da  tez madura,
a cor velada do sal que nos consome .
Prendemos no sargaço
a dor espraiada numa foz longínqua,
e deixamo-la morrer
abandonada
no cansaço escoado das marés
a definharem-se nos dedos.

Entre versos,
plantamos à noite, o uivo dos lobos
e  uma roseira pintada de azul.
Construímos no peito um farol de mariposas
regressadas da colheita de aromas raros,
enquanto desenhamos nas suas asas
um sol amarelo ancorado
a  resgatar naufrágios.
Nem sempre o céu anuncia
a  chuva que nos lava,
mas sabemos,
quando já não nos amarga o que choramos.

10 de julho de 2011

Foi assim, de novo...


Porque nenhuma emoção se diz, tão completamente quanto se sente...















Obrigada!



30 de junho de 2011

" Do outro lado do espelho" apresenta-se em Esposende


Esposende é uma cidade especial, cuja beleza se espelha no rio ao encontro do abraço do mar.
É a minha cidade de adopção e de coração. Cidade onde tenho o privilégio de viver e onde encontro, tantas vezes, a tranquilidade e a inspiração para escrever.
É por tudo isto que, juntamente com a Câmara Municipal de Esposende e a Editora Lua de Marfim, tenho o enorme prazer em  convidar-vos para a sessão de apresentação do meu livro " Do outro lado do espelho" que decorrerá nesta cidade, no dia 9 de Julho na Biblioteca Municipal Manuel Boaventura, pelas 18h30.
Mais uma vez, terei a honra de contar com a presença da escritora e poeta Mel de Carvalho, para fazer a apresentação da obra.

Lá estaremos à vossa espera!

Porque a poesia é uma flor, pronta a ser sol na alma de cada um...




Obrigada!





27 de junho de 2011

Grande lição para gente pequena



Grande é a virtude


 De tão grande vontade


E tão pequena eu sou


Perante o teu exemplo


A propósito da prova de Paratriatlo que decorreu no passado dia 25, no âmbito do Campeonato Europeu de Triatlo em Pontevedra. A temperatura do ar era de 40ºC, nenhum dos paratriatletas desistiu e quem assistiu à prova, teve a honra de receber uma enorme lição de vida.
Eu senti-me privilegiada por isso.
Aqui fica o meu aplauso e a minha gratidão a todos eles!


15 de junho de 2011

Anos verdes




Verdes foram todos os anos

Que não colhi,

Porque não sabia

O quanto pode ser doce

O que de amargo

Guardamos,

Se deixarmos

O tempo nascer maduro

E pronto a ser luz

Para além do ninho das pupilas.



6 de junho de 2011

Silêncios



Preciso de te dizer

Todas as palavras

Que bordo para ti em silêncio

E me doem

Como gelo triturado nos dedos

Enquanto me ignoras




1 de junho de 2011

Caminho de água nascente




Eram passos lentos os que trazia.
Lançava-os no chão. Naquele que sabia e no outro que nunca pisara mas onde cresciam as papoilas que um dia haveria de colher. Um dia, um qualquer dia de um qualquer tempo , numa qualquer dimensão.
Eram passos seguros, firmes, mas propositadamente lentos. Neles, ouvia a história das pedras, respirava o aroma cicatrizante do pó da terra e, enquanto guardava nos bolsos o orvalho da noite suspenso nas ervas daninhas , subia-lhe aos lábios o sabor vertical do trigo a oferecer-se-lhe à fermentação da vida.
Do caminho, não lhe importava o rasto, apenas o peso de si própria moldado no barro, qual ânfora a saciar a fome de humanidade. Talvez por isso levasse consigo, pousadas nos ombros, todas as lágrimas que lhe confiavam e mais umas quantas rugas, suas e de outros, porque o saber do tempo era o único tesouro que conhecia.
Um dia, desejou que tudo de si fosse fértil como água nascente, mas nem por isso apressou ou refreou a passada. Se o sol lhe era força a aquecer a alma, respirava mais fundo para a guardar no coração e aí se abrigar das imperfeições do vento norte. Mas quando era chuva o que chegava do céu, erguia o rosto e recebia nele cada gota, como quem bebe um oásis, sabendo que os desertos existem e aí, nem as pedras desejam falar da sua própria história.
Saboreava cada milímetro da sua caminhada como se semeasse e colhesse estrelas e as amasse a todas de igual modo, como filhos diferentes mas de brilho igual.
De quando em vez, uma rodopiante aragem envolvia-lhe os sentidos e via-se então, de braços abertos, numa afinidade de asas com quem nasce a voar. Era assim que planava livre por dentro dos sonhos e descobria que essa era, de todas, a mais bela viagem.
Eram lentos os passos e grandes os sonhos.
Eram imensos os sabores, e isso já era tanto para se sentir feliz.

27 de maio de 2011

Reinvente-se o grito



Um dia…

Talvez um dia

Se preencham os vazios
Com palavras eruditas
E no pó levantado do chão
Se descubram os deuses
Que obstinadamente
Se mantêm de pé.

Talvez um dia

Os olhos não ceguem
Na descrença dos gestos
Os arados não gemam
De solidão
Nem os mastros se rendam
Ao abandono das marés.

Mas hoje

É urgente que as bocas se encham de espigas
E frutos maduros
E mesmo na ausência de vento
Se reinvente o grito
Como o desfraldar de uma asa
Emanado
Do pundonor de uma bandeira.


19 de maio de 2011

Para que não me esqueça de ti



Quando o tempo adormece
Dentro da tua cabeça
E o que choras
É apenas a saudade que te arrasta,

Deixa que os teus os passos sejam lastro
Da polpa de uma árvore mansa
Sabendo que a paz
Tem a cor do teu cabelo
E da vida,
Te sobram distraídos os minutos
Na lentidão das palavras
Que abandonas
Ao ritmo da tua memória confusa

Já não há veredas que te doam
Nem segredos por inventar
Já não há rio
Onde deixes cair
O pingo de vida que tens,
Suspenso na ponta dos teus dedos

Por isso o pousas no meu rosto
Para que não me esqueça de ti



15 de maio de 2011

Foi assim....



Há momentos em que nada do que eu possa dizer
diz o tanto que eu quero....












Obrigada!
 

3 de maio de 2011

Do outro lado do espelho


 Desprendo de mim as palavras e dou-as a ler,
para que elas possam ser, um novo detalhe nos vossos olhos.


"Do outro lado do espelho" é o meu 1º livro.
Um livro de poesia que tem a chancela da editora  Lua de Marfim, e que,  tendo nascido do incentivo das Vossas leituras e da generosidade das Vossas palavras, muito me honraria a Vossa presença no seu lançamento.
Esse evento, terá lugar no próximo dia 14 de Maio, no Auditório do Campo Grande -56 em Lisboa, pelas 16 horas.
Ladeada  pela escritora Mel de Carvalho e pela jornalista Otília Leitão, lá estarei à Vossa espera.






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