27 de junho de 2013

Diz-me



Diz-me.

Diz-me que o presente
é este fio de luz que prende o meu cabelo,
este sol que aquece a raiz da minha nuca
e me enlaça p'la cintura
como um resgate do tempo
à viagem das águas.

Diz-me que nada mais há 
senão este agora
em que os pássaros festejam
as penas que vestem
e eu me rendo
à rara felicidade de me saber viva.

Diz-me que esta,
apenas esta,
é a verdade que procuro
e jamais temerei o final
neste princípio.



20 de junho de 2013

Nada de novo




Um livro aberto 
sobre uma sombra amarrotada em cima da cama, 
pode nada dizer de novo; eis a surpresa: nada de novo.



16 de junho de 2013

À procura de si




O homem estendeu-se nu sobre a areia
e temendo a invasão dos seixos
deixou-se incrustar em vida salgada
e confundiu-se entre as pedras.

Hoje, à beira de um coração sedento
 procura a  humanidade que deixou
 frágil e  ao acaso
boiando à mercê da erosão do tempo.



13 de junho de 2013

O sono dos barcos




De que matéria são
os sonhos dos barcos que dormem
na lisura da areia?
De que tempestades esperam 
ser salvos
pelas gaivotas que ainda têm asas?




3 de junho de 2013

Palavras à beira do mar


Picasso - Os pobres à beira do mar ( 1903 )

Antes da revolta do mar
as gaivotas, em desespero, guardavam as asas
e cobriam-se de sargaço para que ninguém soubesse
que decidiam morrer antes do fim das palavras.

Dentro do vento, as vozes das mulheres
anunciavam o fim do mundo
tecendo e destecendo o silêncio
com que protegiam o corpo da bruma
e mirradas de colo, agarravam-se ao ventre
na antecipação da angústia.

Na praia, só os meninos
desenhavam o sol dentro das conchas
enquanto  as casas desmoronavam
com o peso do sal sobre as pálpebras
e os homens, presos às estacas
vigiavam o gemido das ondas
quebradas na dureza dos rochedos
e amedrontavam-se como nunca
dentro dos próprios punhos.

Antes da revolta do mar
a terra era uma chaga
a esvair-se de humanidade
e foi preciso semear poesia
à boca de todas as marés
para que o grito amadurecesse
e o mar cantasse o hino
de um coração de lava transbordante
que  desembaraçado de algas e fantasmas
num estrépito se elevou, vivo
a encimar o mastro de uma nova caravela.



1 de junho de 2013

Crianças



Lembrarei todos os dias 
o sorriso que te roubam
e dessa ausência faço uma batalha
até que o futuro to devolva.