28 de abril de 2009

Emocionalmente humanos...

" Sem qualquer excepção, homens e mulheres de todas s idades, de todas as culturas, de todos os graus de instrução e de todos os níveis económicos têm emoções, estão atentos às emoções dos outros, cultivam passatempos que manipulam as suas próprias emoções, e governam as suas vidas, em grande parte, pela procura de uma emoção, a felicidade, e pelo evitar das emoções desagradáveis. à primeira vista, não existe nada de característicamente humano nas emoções, uma vez que é bem claro que os animais também têm emoções. No entanto, há qualquer coisa de muito característico no modo como as emoções estão ligadas ás ideias, aos valores, aos príncipios e aos juízos complexos que só os seres humanos podem ter, sendo nessa ligação que reside a nossa ideia bem legítima de que a emoção humana é especial.
A emoção humana não se reduz ao prazer sexual ou ao pavor dos répteis. Tem a ver, igualmente, com o horror de testemunhar o sofrimento e com a satisfação de ver cumprida a justiça; com o nosso deleite face ao sorriso sensual de Jeanne Moreau ou à densa beleza das palavras e ideias da poesia de Shakespeare; com a voz cansada desencantada de Dietrich Fischer-Dieskau ao cantar Ich habe genug de Bach; com o estilo simultaneamente etéreo e terreno com que Maria João Pires executa Mozart ou Schubert; e com a harmonia que Einstein provocou na estrutura de uma equação. A emoção humana pode até ser desencadeada pela música barata ou pelo cinema de má qualidade, cujos poderes nunca devem ser substimados.
O impacto humano de todas as causas de emoção acima citadas, refinadas ou não, e de todas as tonalidades de emoção que estas provocam, subtis e não subtis, depende dos sentimentos gerados por essas emoções. É através dos sentimentos, que são dirigidos para o interior e são privados, que as emoções, que são dirigidas para o exterior e são publicas, iniciam o seu impacto na mente.
Mas o impacto completo e duradouro dos sentimentos exige também consciência, pois só com o advento do sentido do si podem os sentimentos tornar-se conhecidos do indíviduo que os experimenta. "


António Damásio in " O Sentimento de Si "

25 de abril de 2009

Pessoas singulares IV



Salgueiro Maia
1944-1992


O mais puro símbolo da coragem e da generosidade dos capitães de Abril.

Um Homem Singular


"Aquele que na hora da vitória
Respeitou o vencido
Aquele que deu tudo e não pediu a paga
Aquele que na hora da ganância
Perdeu o apetite
Aquele que amou os outros e por isso
Não colaborou com a sua ignorância ou o vício
Aquele que foi "fiel à palavra dada e ideia tida"
Como antes dele mas também por ele
Pessoa disse"

Sophia de Mello Breyner Andresen

21 de abril de 2009

Reflexos


Um traço, apenas um traço separa a minha vida da tua.
Não há pontos nem virgulas entre nós, apenas este traço
Não, não é um risco. Esse seria, como direi... doloroso
É apenas um traço, delicadamente desenhado. Indelével
Apagá-lo seria demitirmo-nos de ser
Suprimirmo-nos, anularmo-nos, escondermo-nos de nós.
Não, não é isso que queremos!
Sou o que sou. Amo-te
És o que és. Amas-me
Ameno-nos, simplesmente
O que fica de mim em ti e de ti em mim, são apenas reflexos!

16 de abril de 2009

Naturalmente... " Erupção vulcânica "

~~

Em fogo e lava ardente te revelas

Revolta dos Deuses, elemento

Vida em fúria ou sofrimento?

Também na tormenta és , natureza

Surpreendentemente bela!

~~

12 de abril de 2009

Post-Scriptum


Naturalmente, alguns dos meus amigos e fieis leitores dos pequenos detalhes que aqui vou escrevendo, sentiram curiosidade em conhecer a continuação ou o desfecho da história do pequeno Ruben. Sinto-me assim, no dever de acrescentar algo mais ao que já foi escrito.


Uma vida tem muitas histórias e cada uma é apenas um pequeno fragmento, um pequeno pedaço de outras histórias, às vezes de outras vidas também.
A história do pequeno Ruben, é infelizmente idêntica à de muitas outras crianças, algumas órfãs de pais, outras de amor, respeito e dignidade. Mas cada criança é um ser único, com particularidades distintas de todas as outras. Por isso cada uma nos ensina sempre algo diferente, especial.
O Ruben permaneceu internado no Hospital, durante três meses, nesse período foi sempre acompanhado por uma equipa de profissionais e amigos que lhe devolveram a esperança e o ajudaram a sair gradualmente do choque traumático que viveu, de forma a poder verbalizar sentimentos, a recuperar as lágrimas e os sorrisos e a estar pronto para retomar a sua caminhada. Porque a vida de uma criança continua como a de toda a gente, mesmo que a infância fique suspensa no tempo ou presa na dor. Por isso é tão urgente reparar as feridas e os afectos, por isso é tão importante devolver-lhe, o mais rapidamente possível, o tempo e o direito de ser criança e de ter uma família que a ame e a faça sentir novamente feliz.
Durante o tempo em que esteve internado, manteve comigo uma relação especial, como será fácil de imaginar. O dia em que ele foi embora para uma Instituição da Segurança Social que o acolheu, toda a equipa se emocionou.
Ainda me lembro do seu abraço e dos seus olhos brilhantes.
Foi muito difícil vê-lo partir!
Um ano depois, soube que iria viver com uma família de acolhimento, naquele que hoje é o processo de pré-adopção. Depois... bem, depois tal como acontece com tantas outras crianças, perdi o rasto da sua história.
Talvez tenha sido devolvido à Instituição, por não corresponder às expectativas da família que o queria adoptar, aumentando a ferida psicológica da perda e da solidão com a da rejeição. (Como tantas vezes acontece, ainda hoje).
Talvez não tenha saído mais das Instituições de acolhimento que procuram dar a estas crianças tudo o que a vida lhes tirou, mas nunca conseguem substituir uma verdadeira família.
Talvez ele tenha encontrado uma família que o tenha amado e sentido como um verdadeiro filho. Talvez ele se tenha sentido amado e respeitado como tal.
Talvez ele tenha superado aquele terrível dia em que perdeu a mãe e os outros que se seguiram sem ela.
Talvez em algum momento, ele se tenha recordado de mim. Talvez...
Hoje terá 20 anos, o Ruben. Permanecerá sempre na minha vida, como aquele menino frágil, de 8 anos que um dia me chamou o seu "anjo da guarda" e me deu um pedaço de amor da sua vida rasgada.
Outros vieram depois dele, outros virão.
Os pequenos fragmentos das suas histórias, são algumas das minhas grandes lições de vida!

9 de abril de 2009

Pedaço de papel rasgado

Já nos conhecíamos há algum tempo.
Em vários segundos de muitas horas, ele havia fixado o olhar em mim. Olhos mortiços de tristeza.
Não tinha sido fácil comunicar com ele, o mutismo da dor permaneceu ainda durante bastante tempo desde o primeiro dia em que o vi... aquele dia!
Eu estava de serviço, quando ele chegou para ser internado, fui eu que o recebi.
Ruben, 8 anos, encontrado por uma vizinha, junto da mãe que jazia inerte no chão da sala. Disseram que foi difícil fazer com que os seus pequenos braços largassem o pescoço da mãe. Não tinha mais ninguém.
Durante dias, não comeu, não falou, não chorou!
Ninguém conseguia comunicar com ele. Todos o tentavam.
Passei a oferecer-lhe, todos os dias em que estava de serviço, uma folha branca com uma estrela desenhada, para ele pintar e desenhar se quisesse . Sempre que me ia embora fazia-lhe uma festa na cabeça e dizia-lhe: "Gosto muito de ti !"
Começou por me olhar furtivamente, ignorando a folha. Depois pintou a estrela com o lápis castanho e riscou tudo com o preto.
Ao fim de alguns dias, fixou o meu olhar rapidamente e entregou-me a folha com um menino desenhado, um menino sem braços... a estrela não estava pintada.
Perguntei-lhe se podia pintar a estrela e ele anuiu timidamente com a cabeça.
Pintei a estrela... verde.
Conhecíamo-nos então, já há algum tempo.
Naquela Sexta-feira , ele agarrou a minha mão depois do meu gesto carinhoso na sua cabeça e eu não consegui dizer a seguir, a frase de sempre.
Ele tinha-a dito de outro modo.
No dia seguinte entrei no seu quarto, faltava pouco para a meia noite, o início do meu turno. Pensava que ele estava a dormir. Observei-o, aconcheguei-lhe a roupa e preparava-me para sair... quando oiço a sua voz; sumida, trémula: " És o meu anjo da guarda?"
Ignorei a pergunta, emocionada e disse: " Sou eu Ruben !".
" Eu sei" , respondeu ele e deu-me um pequeno pedaço de papel rasgado.
" Dorme..." , sussurei " Vou ver os outros meninos e já venho aqui ao pé de ti".
Saí do quarto, feliz pela conquista da comunicação. Uma luzinha acabava de se acender, a ponte estava em construção.
Abri a mão onde guardava o pedaço de papel que o Ruben me havia dado...
Era a estrela da folha do dia anterior, pintada de amarelo. Por baixo dizia: " Eu também".

4 de abril de 2009

Presenças


Sempre que te levantas, de longas e duras jornadas
Com o desespero das causas perdidas
Sempre que nutres a alma de gritos vendidos
Em trigais revoltos de espigas colhidos
A vida lá está...

Sempre que lavras teu tempo, teu desalento
Com teias de luz, sopros de vento
Sempre que escalas tristezas
Em suaves certezas
A vida lá está...

Sempre que dás mais um passo
Semeias ternura num simples abraço
Sempre que olhas ao fundo e reparas no mundo
A esperança renasce e a vida te encontra
Porque tu já lá estás!