25 de setembro de 2012

Crepúsculo





Quero a noite que é minha
Não sei como respirar este fim de tarde
Os ninhos estão vazios
E pesa-me a angústia desabrigada dos pássaros.




Imagem: Vilhelm Hammershøi

17 de setembro de 2012

Rios de gente




Desconstroem-se
Os movimentos assilábicos da língua
Dentro da boca
E desatam-se os nós das palavras
Que dão corpo à memória.
Somos um passado que nos pesa
E ora nos prende, ora nos liberta
Penas a formarem asas
Numa dor que já não tem suporte nos dedos
E se escreve nas ruas
Para dizer azul, vermelho ou verde
Como um pincel sobre a tela branca dos olhos
Num rosto maior de presente
A traçar novas margens.

Como são belos os rios
Feitos de gente
Tão humano e quente é o seu sangue
Essa voz rasgada das suas águas.



11 de setembro de 2012

Dança de renúncias





Este é o tempo de envelhecer árvores
Há no chão o reboliço das folhas que se despedem
Vão com o vento, expulsas de ramos e raízes
E embora cansadas, secas e tristes
Giram sobre si a cortar silêncios
Assim se elevam em cada fim de tarde
Deste tempo de envelhecer árvores
Numa persistente dança de renúncias.  



3 de setembro de 2012

No deserto das sementeiras





Apagou-se aquela luz inteira
sobre a terra a entristecer
o vento é de cinzas sobre os olhos
na boca o pó
a morte das sílabas.

Que nos resta
se não é de sal a água dos nossos rios?

Repovoemos as entranhas 
do chão
este lugar inóspito
de coração e alma
 e lavremos de novo
à beira mar
um jardim de pássaros
mastros e velas
palavras com raízes
céus de sol e outras estrelas.

Presos ao rescaldo
só as sombras tomarão os rostos
no deserto das sementeiras.