Ando ombro a ombro contigo a dedilhar palavras
E tu olhas-me triste
Porque sou o eco infértil da tua boca
E dela nada ouves senão silêncio
Neste medo meu de envelhecer versos
De os fazer viver à míngua
No espaço perdido dos dedos.
Sabes, talvez nunca os saiba dizer
Talvez te arrependas de caminhar comigo
E dês por perdida esta tua semente
Não, eu não sou poeta!
Falta-me o desassossego
Do ser mais alto e maior dos poetas
A coragem com que rasgam o grito
E tomam a força das aves
A direcção dos caules
O mistério das folhas
A revolta dos mares
O ciclo inesgotável do sol
O pulsar constante da vida.
Falta-me a vida…
Por isso ando de mão dada contigo
Bebendo de ti a polpa dos verbos
Só tu podes fazer-me renascer
Nua de pele, vestida de encanto
E dar à minha voz vazia e calada
O canto que dás aos Homens
E a alma que acendes no povo
Que não sabe viver sem ti.
Só tu podes semear em mim o olhar de poeta
E ensinar-me
Como desbravar na palavra o caminho dos olhos
Como dar ao que choro
A liberdade certa no leito de um rio.
Só tu sabes dizer-me que viver vale a pena
E assim, lado a lado
Talvez faças do espaço amplo do meu peito
Um oceano
Onde podem ancorar todos os barcos
Ou a página rubra
Onde mesmo sem nunca o saber dizer
Um dia eu consiga escrever
O teu poema.