22 de julho de 2008

O Valor das estrelas

Quando vem ao hospital, Isabel vem sempre ter comigo. Tem 40 anos, é uma mulher forte e decidida que espanta com o sorriso o receio que permanentemente a atormenta.
Mastectomizada há seis anos, conhece bem o percurso daqueles que implacavelmente, um dia, recebem a notícia de que a sua vida pode estar a chegar ao fim.
Passou por tudo, desde as consultas aos exames, passando pela cirurgia e pela quimioterapia. Conhece muitos médicos e enfermeiros de vários hospitais. Sente-se eternamente grata e costuma dizer que está constantemente em luta pela vida, uma vida à qual não dava anteriormente grande valor.
- Sabe Sra. Enfermeira, andava sempre a lamentar-me; que não tinha tempo para nada; que não conseguia ganhar o suficiente para comprar uma casa; que me faltava isto e aquilo; que a vida era uma canseira… enfim estava sempre descontente! – desabafou ela comigo, um dia.
A história da doença da Isabel é comum a muitas mulheres. Um dia sentiu um nódulo na mama, mas por desconhecimento ou por medo, adiou a ida ao médico, não evitando, no entanto, que passados quatro meses o veredicto fosse o tão temido cancro.
Foi operada rapidamente e começou, quase de imediato, os ciclos de quimioterapia que manteve durante dois anos. Disse-me uma vez, sentir ainda hoje náuseas e vómitos, quando vai à consulta de rotina no IPO.
- Há três anos que estou bem, mas vivo constantemente com este medo, como se fosse uma nuvem sempre em cima de mim.
O marido e a filha, têm sido simultaneamente o seu apoio e a sua motivação. Recuperou a sua imagem corporal há um ano atrás, quando lhe foi colocado um implante mamário, mas é na forma de viver que diz sentir-se muito diferente.
- Passei a viver um dia de cada vez. Ainda não comprei a minha casa, continuo a trabalhar e já não me lamento por isso. Dedico muito tempo à minha família e acho que agora gosto mais de mim. Sabe Sra. Enfermeira, nas noites em que o céu está limpo, gosto de me sentar na varanda a observar o céu. Nunca tinha dado tanto valor às estrelas!!

1 comentário:

Dulce AC disse...

Olá Maria João.

Continuo por aqui neste seu espaço...e continuarei
cada encontro que vou fazendo seja numa poesia, seja numa história, seja numa imagem...e na música
é sempre sempre uma sentida emoção e é sobretudo um saber certo de não desistir do que for na vida...

Esta história maravilhosamente escrita tão cheia de vida é tão importante..., talvez por ser uma história comum a muitas mulheres, mas sobretudo pela sua sensibilidade ao escrevê-la que faz dela um louvor à vida...

Procurei ontem e não encontrei o Seu "Abraço" aqui reencontrado e lá ...onde lhe escrevi umas palavras de encontro com a vida.

É o que sinceramente sinto ao vir até si...e isso é inquestionável Maria João, o que sentimos ao Lê-la é uma enorme vontade de abraçar a vida, mesmo e com os revesses que nos vão acontecendo..
porque como tão bem escreve e que alento é para todas as mulheres...

" Todas as mulheres têm dentro de si,
uma fonte inesgotável,
que nem sempre conhecem.

A mesma com que a natureza se veste,
para receber o Sol,
a chuva ou o nevoeiro,
todas as manhãs"

Belíssimo.

A Maria João escreve o que tantas vezes sentimos e não conseguimos expressar em palavras.

A Maria João tem esse dom maravilhoso e tão raro de transformar a nossa vida em palavras que ao lermos nos permitem crescer e conhecer mais do ser que somos,
e isso é de uma gratidão que não conseguiremos nunca retribuir...

Um dia quem sabe possa dar-lhe o tal abraço que é tanto..!

Obrigado..vou enviar-lhe um e.mail,
mesmo ...muito obrigado Maria João:))

E estarei sempre tão grata aos Queridos amigos que já sei ter, à Manuela e ao Jaime, porque através deles aqui vim ter, a si.

Num beijinho um grande abracinho.

Dulce